Mt 10, 1-42; Lc 6, 12-16
"Naqueles dias, Jesus foi à montanha para orar, e passou a noite inteira em oração a Deus. Depois que amanheceu, chamou os discípulos e dentre eles escolheu doze, aos quais deu o nome de apóstolos¹."
"Chamou os doze discípulos e deu-lhes autoridade de expulsar os espíritos imundos e de curar toda a sorte de males e enfermidades."
Este discurso de Jesus é narrado por três evangelistas, exceto João. Ele foi dito em Cafarnaum. Perto de um poço, Jesus sentou-se numa pedra à sombra de urna árvore, com os discípulos à Sua volta. Era o momento propício para passar-lhes um "ecocardiograma", podemos assim dizer, de seus corações com a Igreja.
A lista dos apóstolos existe em quatro formas diferentes (Mt 10,2-5; Mc 3,13-19; Lc 6,12-16; At 1,12-14). O primeiro nome é o mesmo em todas elas: Simão, a quem Jesus impôs o nome de Pedro. Judas Iscariotes, o traidor, figura sempre em último lugar. Mateus começa relacionando dois irmãos: Pedro e André. Em seguida, cita Tiago e João seu irmão, filhos de Zebedeu. Depois: Filipe e Bartolomeu (Natanael); Tomé e Mateus, o publicano (cobrador de impostos); Tiago, o filho de Alfeu, e Tadeu; Simão, o Zelota, e Judas Iscariotes.
Jesus dá aos apóstolos "autoridade de expulsar demônios e de curar toda a sorte de males e enfermidades", inclusive ao traidor que, como os demais, recebeu a missão de evangelizar.
Este discurso de Jesus nos mostra o que é o palpitar do coração da Igreja. É a Igreja humana que tem no seu centro a Igreja divina, representada por João. Jesus teve o cuidado de enumerar os apóstolos, começando com Simão (Pedro), que representa a Igreja humana. Mas no centro do coração da Igreja humana pulsa o coração da Igreja divina.
O discurso de Jesus é como um ecocardiograma da Igreja. Ele nos mostra o coração da Igreja. É aquilo que o nosso coração fala. Nosso coração ama, duvida, nega, trai, às vezes entra em lugares que não deve.
Jesus nomeou Samaria que, naquela época, era algo fora do contexto. Nosso coração nunca está em paz. Ele sempre vem para nos dar a espada, sempre pergunta, nunca responde.
Este coração nos mostra como agir: "Eu não vim trazer a paz, e sim a espada". Quer dizer, este coração que sempre pergunta, questiona, criando divisões nele mesmo, está sempre batendo de forma diferente.
Hoje, vendo a Igreja de Cristo no mundo inteiro, entendemos um pouco esse discurso. A divisão na Igreja, a quantidade de seitas cristãs, diversidade de opiniões, de posições dentro da própria Igreja. É o palpitar desse coração.
Jesus, ao enviar os Apóstolos, recomendando-lhes: "Ao entrardes em uma casa, saudai-a. E, se for digna, desça a vossa paz sobre ela. Se não for digna, volte a vós a vossa paz.", nos mostra toda a coluna desse discurso. A casa é o nosso coração. Quando se aproxima de coração para coração, deseja-se a paz. A paz da imagem e semelhança de Deus, que nos foi dada de graça e de graça devemos passá-la para frente. Agora, se o outro coração não está receptivo, a paz não se perde, porque a imagem de Deus não se perde, ela volta para nós.
A grande mensagem de Jesus aos nossos corações foi esta: "…proclamai que o Reino dos Céus está próximo". O Reino dos Céus é a misericórdia de Deus em nos criar e chamar ao Seu convívio. Não há coisa mais próxima de nós que este Reino. Se não aprendermos a expulsar nossos demônios, não vamos encontrar o Reino de Deus, o palpitar desse coração.
O coração é egoísta; bate para si próprio; não consegue dividir, desarmoniza-se com as coisas. A desarmonia de nora com sogra, de pai com filho, é a batida de um coração que sempre pergunta. E Jesus, nesse discurso, quer nos dizer que ali, naquela Igreja onde havia uma fagulha divina e duas traições, é o bater do coração de Sua Igreja em todos os séculos.
O cerne da questão é o que dialogamos com o coração das pessoas; o que entendemos como Reino de Deus perto de nós. Ele realmente está próximo e não vai acontecer depois. A resposta a esta questão, nós a temos quando Jesus diz a Pilatos: "Meu reino não é deste mundo…". Quer dizer, o meu coração não é deste mundo, se fosse assim o Pai mandaria os anjos do Céu pelejar para me salvar. Isto porque nem o Pai, por Sua própria vontade, interfere naquilo que temos dentro do coração: o livre-arbítrio. É um coração que manda em si próprio.
Este discurso disseca o coração da Igreja. Por isso Ele não retira Judas. Estes foram aqueles que o Mestre escolheu para evangelizar. Judas também. São estes joios que há no meio da gente, joios que Jesus mesmo disse para não arrancar, deixar crescer, para que o trigo, também, não seja cortado. É necessário que este coração da Igreja caminhe junto a outros corações, a outras ideias, questionamentos, porque somente assim conseguiremos discernir entre o trigo e o joio, evitando assim que sejam confundidos.
Naquele momento, em Cafarnaum, Jesus achou de dizer que todos nós somos o coração da Igreja. Nós que perguntamos, mas não respondemos, brigamos, dividimos, negamos, perdoamos; nós que caminhamos em águas de difícil navegação. Nós que pulsamos de certa forma, que criamos situação de união ou divisão. É este o coração da Igreja de Jesus, tendo no cerne a Igreja divina. João está ali. João não falou sobre isto, porque sabia o seu lugar.
Se não conseguirmos exorcizar os nossos demônios, se não formos auto exorcistas por competência, se não buscarmos o entendimento de como Cristo era inteligente, não vamos encontrar o Reino de Deus.
1-Apóstolo: enviado. "O termo, já conhecido no mundo grego e no mundo judeu, veio a designar no cristianismo os missionários enviados, como testemunhas de Cristo, de Sua vida, morte e ressurreição."
Referência: LOPES, Raymundo. Escolha dos Apóstolos e sua Missão: Mt 10, 1-42; Lc 6, 12-16. In: LEMBI, Francisco (Org.). O Código Jesus. Belo Horizonte: Magnificat, 2007. p. 74.