Expulsar-vos-ão das Sinagogas

Jo 16, 1-33

Este capítulo de João é para mim o mais confuso do Novo Testamento. Vários teólogos escreveram sobre esta passagem, sem que chegassem a um consenso. Ele começa dizendo:

"Digo-vos isto para que não vos escandalizeis." Em hebraico, o sentido literal da palavra escandalizar é: pedra que faz tropeçar; para nós, é chocar, ofender a humanidade da pessoa. Jesus previne os seus discípulos sobre as provações que os esperam, para que não fiquem surpresos e não vacilem na fé.

"Expulsar-vos-ão das sinagogas. E mais ainda: virá a hora em que aquele que vos tirar a vida julgará prestar culto a Deus." Jesus falava a verdade e estava, também, instigando os fariseus, pois sabia que eram pessoas muito devotadas a Deus e que, às vezes, chegavam ao ponto de matar em nome dele. A lei permitia que apedrejassem a pessoa que ofendesse a Deus, como era o caso da mulher adúltera. Matavam em nome dele.

"E isto farão porque não conheceram o Pai nem a mim." Jesus com isto dizia que os fariseus estavam cheios de normas e regras, mas, na verdade, não conheciam a misericórdia do Pai e nem a Sua.

"Mas Eu vos digo tais coisas para que, ao chegar a sua hora, vos lembreis de que vo-lo anunciei." Isto é: Eu lhes digo essas coisas para que saibam e não fraquejem quando acontecerem.

Vamos analisar esta parte. Jesus estava numa situação delicada. Seus inimigos eram os fariseus, formalistas, cheios de ritos e normas. Exteriormente, mostravam muito zelo para com as coisas de Deus. Jesus sabia que a partir do momento em que demonstrasse estar criando algo novo, o cristianismo, aquilo ofenderia grande parte dos judeus, a começar dos fariseus, pois o tomariam como uma seita. E realmente estava criando uma Igreja com a boa nova, embora incorporando a ela o Antigo Testamento. Como não o reconheciam como o Verbo encarnado, não aceitariam também Sua pregação. Por isso os que nele creram seriam tratados pelos fariseus e sacerdotes da forma como lhes anunciou. Por quê? Pelo zelo que eles tinham a Deus.

"Não vos disse isso desde o começo porque estava convosco. Agora, porém, vou para Aquele que me enviou e nenhum de vós me pergunta: Para onde vais?" Jesus usou dessa estratégia para que os apóstolos não ficassem desencorajados, a missão era de renúncia total e os fariseus, escribas e sacerdotes, classes dominantes, seriam seus algozes. Era necessário que já estivessem bem engajados, para não sucumbirem àquele prenúncio. Com isso, Jesus queria ainda dizer: Eu não faço como os fariseus, não sigo seus ritos, não lavo as mãos, como fazem, faço milagre no sábado… e vocês não me perguntam o porquê?

"Mas porque vos disse isto, a tristeza encheu os vossos corações." Eles tiveram receio de ficar sós, diante dos fariseus, escribas e sacerdotes, diante do poder com o qual seria mais cômodo se compor.

Enquanto que a presença de Jesus lhes transmitia segurança e coragem.

"No entanto, Eu vos digo a verdade: convém a vós que Eu parta, pois, se Eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas se Eu for, enviá-lo-ei a vós." Jesus não se coloca no lugar do Espírito Santo, deixa claro que cada um tem a sua atuação e que sua partida abriria caminho para a vinda do Espírito Santo, que lhes daria a entender tudo que falara e força para enfrentar a situação adversa.

"E quando Ele vier, estabelecerá a culpabilidade do mundo a respeito do pecado, da justiça e do julgamento." Três assuntos que atemorizavam os fariseus, que só os discutiam entre si: decidiam o que era pecado, o que era justiça e julgavam conforme o seu interesse, colocando-se como únicos intérpretes destas questões cruciais para os judeus. Por isso Jesus lhes falou dessas três coisas. Atacou os fariseus no seu ponto fraco.

"…(a respeito) do pecado, porque não creem em mim." Isto é, o verdadeiro pecado é não crer em Jesus. Os fariseus e escribas não acreditavam nele. Os sacerdotes, além disso, o invejavam, pois não eram capazes de fazer os milagres que fazia. Jesus lhes parecia estar fundando uma seita dentro do judaísmo, formando um grupo dissidente e, o mais grave, se revelando o Messias. Representava, por isso, uma ameaça ao conservadorismo judaico, ao statu quo da classe dominante.

"…(a respeito) da justiça, porque vou para o Pai". Aquilo que os fariseus tinham como justiça era muito diferente. E eles ainda hoje acham que estão com o Pai.

"…e não mais me vereis." Aí começa a confusão, porque falou de justiça, que vai para o Pai e não mais o verão. Isto é, não o verão mais como imaginavam vê-lo. Os fariseus achavam que o Pai estava com eles. Jesus falava de Sua presença física entre eles, ensinando-os, conduzindo-os. Desta forma eles não mais o teriam.

"…(a respeito) do julgamento, porque o Príncipe deste mundo já está julgado." Os fariseus eram considerados os príncipes do Templo, da Igreja da época. Daqui é que surgiu a palavra príncipe, designando o demônio. Mas na verdade o que Jesus quis dizer é que toda a classe farisaica era considerada príncipe da Igreja. O Príncipe deste mundo já está julgado, isto é: aqueles que se acham os donos do mundo, da verdade, com autoridade para julgar, estão enganados, só Deus é o Juiz. Era um recado de Jesus para os fariseus.

"Tenho ainda muito a vos dizer, mas não podeis agora compreender." Claro! Estava atacando a classe dominante, sobretudo os fariseus, "fundando uma seita" com Seus ensinamentos, se dizendo o Filho de Deus, se falasse mais os apóstolos ficariam muito confusos.

"Quando vier o Espírito da Verdade, Ele vos conduzirá à verdade plena, pois não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que virão." Quando vier o Espírito da Verdade, toda dúvida e receio passarão, porque Ele revelará o sentido do que foi dito, da morte e ressurreição de Jesus, da derrota e condenação do Príncipe deste mundo e da nova ordem das coisas. Receberão o discernimento de todas essas coisas e perceberão que os fariseus não estavam com a verdade. O Espírito não vai falar de si mesmo, mas estará entre vocês, dando-lhes força e entendimento de tudo que falei. O Espírito vai anunciar o que há de acontecer, dará um cunho profético às suas palavras. Quando vocês entenderem que "Eu Sou", dirão coisas que estão por vir. É a missão profética da Igreja. Jesus não se diz o Espírito Santo, nem o Espírito Santo se coloca como único.

"Ele me glorificará porque receberá do que é meu e vo-lo anunciará." Aqui os teólogos se confundem. Jesus está falando de si em relação aos fariseus. Vocês (seus discípulos) vão falar daquilo que lhes estou falando.

"Tudo o que o Pai tem é meu." Os teólogos têm dificuldade em explicar esta frase. Jesus estava certo do que falava naquele momento. Tudo que é do Pai é meu, portanto, tudo que é dele é do Pai. Por isso disse: "Receberá do que é meu e vo-lo anunciará." Jesus é então o caminho do Pai, falando tudo o que Ele quis que fosse dito. Vocês não devem ser como os fariseus: acham que o Pai está morando com eles. O Pai não está lá dentro, Eu é que estou aqui fora falando com vocês.

"Um pouco de tempo e já não me vereis; mais um pouco de tempo ainda e me vereis." O sentido literal é um velado anúncio de Sua morte e ressurreição. Mas Ele quis também dizer uma outra coisa: a hora em que Eu não estiver mais aqui, vocês se dispersarão por medo dos fariseus, preferirão dar atenção a eles do que a mim, mas depois verão que tenho razão, aí me verão.

"Disseram entre si alguns de seus discípulos: Que é isto que Ele nos diz: 'Um pouco e não me vereis e novamente um pouco e me vereis'? E: 'Eu vou para o Pai'?" Jesus estava sendo confuso para eles, pois não entendiam que lhes falava dos fariseus.

"Diziam então: Que é 'um pouco'? Não sabemos de que fala. Compreendeu Jesus que queriam interrogá-lo e lhes disse: 'Vós vos interrogais sobre o que Eu disse: 'Um pouco de tempo e já não me vereis; mais um pouco de tempo ainda e me vereis'?" Jesus ficou preocupado ao perceber que estavam confusos com o que dissera.

E muda o discurso."Em verdade vos digo: chorareis e vos lamentareis, mas o mundo se alegrará." Vai aqui um recado aos fariseus: vocês se arrependerão amargamente, por estarem confiantes no que fazem e apostarem na derrota do que não entendem; mas a humanidade se alegrará por ter sido redimida por este ato.

"Vós vos entristecereis, mas a vossa tristeza se transformará em alegria." Vemos aqui uma alusão à dor daquela separação, à tristeza da paixão e à alegria de rever o Cristo ressuscitado e o cumprimento da promessa da vinda do Paráclito. Vocês vão ficar tristes, mas se persistirem no que lhes falo, verão que tenho razão.

Em seguida altera um pouco o tom do discurso. "Quando a mulher está para dar à luz, entristece-se porque a sua hora chegou;…" Naquela época não existia ultrassom para saber se era menino ou menina. Quando a mulher se engravidava, o primeiro sentimento que tinha era de tristeza, pelo medo de ter uma filha em vez de um filho. Mulher tinha pouco valor entre os judeus. A gravidez da judia era um período de ansiedade, com receio de nascer uma menina.

"…quando, porém, nasce a criança ela já não se lembra dos sofrimentos, pela alegria de ter vindo ao mundo um homem." Na linguagem bíblica designa o doloroso nascimento do mundo novo, messiânico. Mas Jesus dizia uma  outra coisa: os fariseus, com toda aquela pompa – uma situação que armavam –, estavam grávidos de alguma coisa, mas não sabiam o que ia acontecer. Ensinavam coisas que não praticavam; colocavam fardos sobre os ombros das pessoas, que eles próprios não carregavam. Isto criava neles (fariseus) uma tristeza. E quando alguma coisa dava certo, se alegravam. Jesus queria mostrar que os fariseus jogavam na incerteza. Se desse certo, eles se gabavam, se vangloriavam. Jesus falava da política dos fariseus.

"Também vós, agora, estais tristes; mas Eu vos verei de novo e vosso coração se alegrará…". Se vocês entenderem o que Ele está falando com os fariseus lá, vão entender aqui. Vocês agora estão tristes, mas quando Eu voltar se alegrarão e verão que tenho razão.

"…e ninguém vos tirará a vossa alegria. Nesse dia, nada me perguntareis. Em verdade vos digo: se pedirdes alguma coisa ao Pai em meu nome, Ele vo-lo dará. Até agora, nada pedistes em meu nome; pedi e recebereis para que a vossa alegria seja completa." Os Judeus ficavam ali, numa cerimônia interminável. E o Pai não lhes dava nada, pois rezavam atendendo a um rito, a uma prescrição, a uma formalidade. Por isso Jesus falou que não haviam pedido nada ao Pai, e que seriam atendidos se pedissem em Seu nome.

"Disse-vos estas coisas por figuras (comparações e parábolas). Chega a hora em que não vos falarei mais em figuras, mas claramente vos falarei do Pai." Jesus cumpriu o que disse porque, logo depois, começou a se abrir, demonstrando com mais clareza quem era. A própria ressurreição, ascensão e vinda do Espírito são provas disso. "Nesse dia, pedireis em meu nome e não vos digo que rogarei ao Pai por vós, pois o próprio Pai vos ama, porque me amastes e crestes que vim de Deus." Jesus está dizendo que eles precisavam separar as coisas, da forma como procediam não estava correto.

"Saí do Pai e vim ao mundo; de novo deixo o mundo e vou para o Pai. Disseram-lhe seus discípulos: 'Eis que agora falas claramente, sem figuras!'" Foi aí que os discípulos começaram a perceber que Jesus atacava os fariseus. Eu imagino até o lugar onde Jesus poderia estar: na porta da sinagoga, ou em lugar semelhante.

"Credes agora?! Eis que chega a hora – e ela soou – em que vos dispersareis, cada um para o seu lado, e me deixareis sozinho. Mas Eu não estou só, porque o Pai está comigo. Eu vos disse tais coisas para terdes paz em mim. No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: Eu venci o mundo!" No momento de Sua prisão, condenação e crucificação os discípulos se dispersariam, deixando-o sozinho. Mas na verdade não ficaria só, porque o Pai estaria com Ele. E os encoraja para a difícil missão que os aguarda, porque daquela aparente derrota saíra vitorioso.

Este capítulo de João deve ter sido proclamado por Jesus em lugar público, na presença de fariseus e escribas, como numa sinagoga, ou mesmo num jantar. Jesus estava sem liberdade para falar exatamente o que pensava. Começou a instruir os discípulos, dizendo: essa política dos fariseus não os conduz a lugar algum… Se vocês não crerem na Boa-Nova que lhes trago, viverão como os fariseus. Jesus irritava os fariseus porque falava para os apóstolos, seus amigos.

É um discurso no qual Jesus se apresenta e ao mesmo tempo ataca os fariseus. Um discurso de dificílima compreensão, por discorrer com muita sutileza sobre um assunto amplo e profundo.

 

Referência: LOPES, Raymundo. Expulsar-vos-ão das Sinagogas: Jo 16, 1-33. In: LEMBI, Francisco (Org.). O Código Jesus. Belo Horizonte: Magnificat, 2007. p. 186.

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