Especialista peruano em Teologia da Libertação revela o “esquema” por trás do Sínodo da Amazônia.
Segundo Julio Loredo, o pano de fundo não revelado do Sínodo da Amazônia é que há décadas está em produção e sendo desenhada uma “mudança de toda a Igreja” conforme a “chamada teologia indigenista e ecológica”. Em termos de eclesiologia, isso coincide com as visões mais extremadas dos modernistas e progressistas.
Diane Montagna.
LifeSiteNews, 22 de junho de 2019.
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Tradução. Bruno Braga.
O próximo Sínodo dos Bispos sobre a região da Amazônia é um “esquema” que visa “renovar” a Igreja de acordo com “as versões mais radicais da Teologia da Libertação”, afirmou o autor peruano.
Julio Loredo, presidente do braço italiano da Tradição, Família e Propriedade (TFP) e autor de “Teologia da Libertação: um salva-vidas de chumbo para os pobres” (Associação Instituto Plínio Corrêa de Oliveira, 2016), disse que o pano de fundo não revelado do Sínodo da Amazônia é o de que há décadas está em produção e sendo desenhada uma “mudança de toda a Igreja” conforme a “chamada teologia indigenista e ecológica”.
“É uma completa renovação da Igreja sob um ponto de vista ‘amazônico’, que nada mais é que o auge da Teologia da Libertação”, comentou Loredo ao LifeSiteNews, no dia 21 de junho.
Loredo, que trabalha como editor e colaborador do novo site “Pan-Amazon Synod Watch” , lançado por uma coalizão internacional que busca combater tais esforços, observou que essa visão “agora está sendo proposta a toda a Igreja por um Papa da América Latina”.
“Isso é muito importante”, disse ele, acrescentando que essa visão, “em termos de eclesiologia, também coincide com as visões mais extremadas dos modernistas e progressistas”.
Loredo notou que o próximo Sínodo “está sendo preparado e composto por uma rede muito bem organizada de movimentos e associações indigenistas”, como a REPAM (Rede Eclesial Pan-Amazônica).
“Todos os seus mentores vêm dos ramos do movimento da Teologia da Libertação”, disse.
“Outro ponto a ser levantado”, acrescentou Loredo, “é que a Encíclica Laudado si é o fundamento doutrinal do Sínodo”. Essa Encíclica “tem partes inspiradas pela teologia da libertação ecológica, ou eco-teologia, e partes baseadas em documentos da ONU, como a Agenda 21 e o Tratado sobre biodiversidade”. Esses são tratados obrigatórios para todos os países signatários da Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, em 1992, explicou o autor peruano. “Esses documentos foram estudados e propostos por pesquisadores da Internacional Socialista que buscavam explorar formas de pós-socialismo e pós-comunismo. Conceitos como ‘desenvolvimento sustentável’ e ‘crescimento negativo’ foram lançados por esses documentos. Então, não estamos falando apenas da Igreja na Amazônia”.
Loredo disse que está “impressionado” com a extensão com que o Vaticano, por meio do Sínodo da Amazônia, está assumindo “a agenda neo-pagã proposta pela ONU em conferências como a Rio 92 e a Rio +20, de 2012”.
“Eu participei como jornalista da conferência de 1992, e estudei essas questões a fundo”.
Sobre o documento preparatório e o Instrumentum laboris para o Sínodo de outubro, Loredo disse que é preocupante o fato de que esses documentos “abraçam a interpretação radical do ‘desenvolvimento sustentável'”.
Igualmente preocupante, disse, é a completa ausência de qualquer coisa negativa sobre as tribos da Amazônia, algumas das quais “praticam canibalismo, infanticídio e feitiçaria”.
“Para alguém como eu, que tem estudado a Teologia da Libertação e a teologia indigenista por várias décadas, muitas coisas nesses documentos são perfeitamente claras. Mas, para quem não acompanha essas correntes, pode ser confuso ou pelo menos não totalmente compreensível”.
Eis a nossa entrevista com o senhor Julio Loredo.
LIFESITE. Senhor Loredo, responsável por lançar o site “Pan-Amazon Synod Watch”, que garantia pode dar aos leitores de que irão encontrar nele uma fonte confiável de informação a respeito das questões que envolvem o Sínodo de outubro?
JULIO LOREDO. O site foi organizado por uma rede de associações conservadoras. Ele pertence oficialmente ao Instituto Plínio Corrêa de Oliveira, em São Paulo, Brasil. O doutor Plínio Corrêa de Oliveira (1908-1995) estudou as chamadas correntes indigenistas já dentro da Igreja desde o início dos anos 1970. Mas é um site que envolve não só a Tradição, Família e Propriedade, mas também outras associações conservadoras internacionais.
Ele contém artigos escritos por especialistas renomados, cientistas, filósofos e professores; por isso, o material é altamente acadêmico. Por exemplo, ele traz artigos do professor Evaristo Miranda, que é um dos maiores especialistas do mundo sobre a Amazônia. O doutor Miranda é chefe da EMBRAPA, responsável pelo monitoramento por satélite da Amazônia no Brasil. Como deve saber, o Brasil tem o seu próprio programa espacial. O sistema de satélite no Brasil é altamente desenvolvido. A EMBRAPA Monitoramento por Satélites é um órgão do governo que monitora a Amazônia, e o professor Miranda é o seu chefe. Há muitos artigos do professor Miranda, assim como de ecologistas de ponta dos Estados Unidos e de outros países. Muitas figuras de credibilidade estão escrevendo para o site.
O Vaticano publicou o Instrumentum laboris para o Sínodo da Amazônia no início deste mês. Ele atraiu consideravelmente a atenção da mídia, principalmente por sugerir um relaxamento no celibato sacerdotal para a região amazônica. Na sua visão, o que a mídia, o clero católico e os fiéis de um modo geral devem saber a respeito do Sínodo? Onde devemos focar nossa atenção?
Há uma história não contada que não recebeu atenção suficiente da mídia ocidental. O Cardeal Pedro Barreto, vice-presidente do REPAM (Rede Eclesial Pan-Amazônica), disse de forma muito clara nos últimos dias que o plano que pretendem realizar no Sínodo é aquele no qual têm trabalhado por quase 50 anos. Então, há todo um plano, todo um esquema por trás do Sínodo, e que consiste na introdução da chamada teologia da libertação indigenista, desenvolvida ao longo dos últimos 40 ou 50 anos. Seria agora o momento de propô-la à Igreja inteira.
A imprensa europeia está focando no celibato sacerdotal e na possível “ordenação” diaconal de mulheres. Ambos são aspectos muito importantes do plano; mas há toda uma história por trás disso. O que eles querem é mudar a Igreja inteira de acordo as versões mais radicais da Teologia da Libertação – a chamada teologia indigenista e ecológica.
Eu tenho acompanhado isso por muitas décadas. Em 1977, Plinio Corrêa de Oliveira escreveu um livro sobre o tema, intitulado “Tribalismo Indígena: o ideal comuno-missionário para o Brasil no século XXI”, no qual descreve muito bem o que está acontecendo hoje. Porém, esse panorama não está muito presente ou não é amplamente conhecido pelo público europeu. Foi mais uma situação latino-americana, e que está agora sendo proposta por um Papa latino-americano para toda a Igreja, e isso é muito importante. Em termos de eclesiologia, isso também coincide com as visões mais extremadas dos modernistas e progressistas.
No Sínodo da Juventude do ano passado, certas questões controversas (como a inclusão da linguagem LGBT) foram antecipadas, mas a ênfase pesada do documento final sobre a “sinodalidade” e a eclesiologia não era esperada. Que surpresas reservam o Sínodo da Amazônia?
Se você ler os documentos preparatórios para o Sínodo, principalmente o Instrumentum laboris, você verá que eles querem reinterpretar toda a Igreja a partir de uma perspectiva “amazônica”. Chamam isso de uma nova Igreja com “um rosto amazônico”. Eles querem reinterpretar a Igreja como um todo, e esse é um ponto que, penso eu, a imprensa europeia não está destacando o suficiente. Não é simplesmente o problema de relaxar o celibato sacerdotal, por mais importante que ele de fato seja, ou o problema da ordenação de mulheres. É uma completa renovação da Igreja sob um ponto de vista “amazônico”, que nada mais é que o auge da Teologia da Libertação.
Se eles conseguirem, será a revolução mais perniciosa que já aconteceu na história da Igreja.
Na coletiva de imprensa para apresentar o Instrumentum laboris, no dia 17 de junho, o LifeSiteNews abordou os organizadores do Sínodo sobre isso. Questionamos: “Lendo o documento de trabalho, temos a impressão de que a ideia não é somente ajudar a Amazônia, mas dar ao restante da Igreja ‘um rosto amazônico’, expressão que o Papa Francisco utilizou várias vezes. Esse Sínodo trará implicações e ramificações para o restante da Igreja?”. O Bispo Fabio Fabene, sub-secretário do Sínodo dos Bispos, respondeu insistindo que o Sínodo é dedicado apenas à Amazônia. Mas ele acrescentou que poderia ter repercussões “a partir de um ponto de vista pastoral para a Igreja, especialmente… no campo da ecologia”.
Exatamente. Eles estão propondo uma série de ideias, como a “conversão à ecologia integral”, que seria válida para toda a Igreja. Estão utilizando o Sínodo da Amazônia para propor um novo modelo de Igreja.
O senhor acredita que os povos indígenas estão sendo explorados para realizar a revolução eclesial que descreveu?
O Sínodo está sendo preparado e composto por uma rede muito bem organizada de movimentos e associações indigenistas, como a mencionada REPAM. Todos os seus mentores vêm dos ramos do movimento da Teologia da Libertação que, em anos mais recentes, desenvolveram-se nesse sentido e no sentido de uma “ecologia integral”. Em tal jornada, eles envolveram índios amazônicos altamente engajados, como o Chefe Kayapó Raoni. Mas duvido que ele represente a maioria dos povos indígenas. Conhecendo muito bem a realidade da Amazônia, eu diria que a imensa maioria quer se integrar à sociedade moderna.
Outra passagem do Instrumentum laboris que causa preocupação é o n. 127. Ela diz que a “autoridade” na Amazônia é “rotativa” e, por isso, seria oportuno “reconsiderar a ideia de que o exercício da jurisdição (poder de governo) deve estar vinculado em todos os âmbitos (sacramental, judicial e administrativo) e de maneira permanente ao sacramento da ordem”.
Como eu disse, eles querem renovar toda a Igreja a partir de uma perspectiva “amazônica”. Um capítulo do Documento preparatório trata da “dimensão sacramental”, e estabelece que os Sacramentos devem ser interpretados sob essa luz, inclusive o Sacramento da Ordem. É óbvio que estão usando o “rosto amazônico” como pretexto para implementar um antigo esquema progressista: a confusão relativa ao sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio sacramental do clero. Eles querem atenuar, senão destruir, a autoridade da Igreja. Eles têm uma visão igualitária da Igreja e da sociedade.
Dito isso, qualquer um que tenha estado na Amazônia sabe muito bem que a autoridade nas tribos indígenas é tudo menos “rotativa”. Tribos indígenas têm uma estrutura ditatorial, em que o poder do chefe é superado somente pelo poder do feiticeiro.
Outro ponto a ser levantado é que a Encíclica Laudado si é o fundamento doutrinal do Sínodo. Essa Encíclica tem partes inspiradas pela teologia da libertação ecológica, ou eco-teologia, e partes baseadas em documentos da ONU, como a Agenda 21 e o Tratado sobre biodiversidade. Esses são tratados obrigatórios para todos os países signatários da Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, em 1992 [1]. Esses documentos foram estudados e propostos por pesquisadores da Internacional Socialista [2] que buscavam explorar formas de pós-socialismo e pós-comunismo. Conceitos como “desenvolvimento sustentável” e “crescimento negativo” foram lançados por esses documentos. Então, não estamos falando apenas da Igreja na Amazônia.
Nos últimos anos, o Vaticano parece ter reforçado sua cooperação com a ONU.
Exatamente. Uma coisa que me impressiona quanto à Encíclica Laudato Si e o Sínodo da Amazônia é a extensão com que o Vaticano está assumindo a agenda neo-pagã [3] proposta pela ONU em conferências como a Rio 92 e a Rio +20, de 2012. Eu participei como jornalista da conferência de 1992, e estudei essas questões a fundo.
Para além do que já comentamos, o que as pessoas acharão mais surpreendente quanto à situação na Amazônia descrita para este Sínodo?
Penso que os europeus, e em geral os povos ocidentais, ficarão chocados com a proposta do Sínodo de colocar as tribos amazônicas como portadoras de uma nova revelação para o nosso tempo, e que isso irá renovar toda a visão da Igreja e do Catolicismo. Eles chamam a Amazônia de “lugar epifânico”, uma “fonte de revelação divina” (Instrumentum laboris, n. 19). O que eles entendem por nova revelação indigenista para o mundo do século XXI? Isso é muito preocupante.
Outra coisa que pode chocar as pessoas é o fato de que eles abraçam a interpretação radical de “desenvolvimento sustentável”. É dito que o nível de consumo hoje está muito além da capacidade da Terra de produzir comida e materiais. Assim, teríamos que reduzir drasticamente o nosso nível de consumo, adotando modelos de maior austeridade e pobreza. Aqui entra o modelo tribal. Eles dizem que os índios podem nos ensinar a sermos pobres e ainda felizes. Estão propondo a doutrina do “bem viver” (Instrumentum laboris, n. 12, 13) – que não é viver na abundância, e sim na pobreza, mas em perfeita comunhão com a natureza. É o “bem viver”. Eles estão contra a industrialização, contra não apenas o consumismo, mas verdadeiramente contra o consumo. Dizem que temos que reduzir nossos níveis de consumo, porque a Terra não pode suportá-los. Isso também é muito preocupante, pois significa que querem que eliminemos uma série de benefícios trazidos pela civilização industrial.
Quando o senhor diz “eles”, a quem está se referindo?
Refiro-me às pessoas que na ONU propõem essa doutrina do desenvolvimento sustentável e àquelas que na Igreja abraçam essa mesma doutrina, que é uma parte essencial do que eles querem fazer no Sínodo. Os documentos propostos para o Sínodo são muito claros. Eles querem que os índios da Amazônia sejam os evangelizadores do mundo.
Por meio do “bem viver”…
Exatamente. E isso também é muito chocante. Claro, como cristãos, somos chamados a viver modesta e humildemente, a cuidarmos do dom da criação, que nos foi confiado a uso por nosso Pai do Céu. Mas, se interpretada de forma linear e tomada nas suas últimas consequências, essa forma de pensar quer dizer que devemos renunciar a muitos benefícios da sociedade moderna. Pense se as pessoas vão abrir mão dos carros, eletricidade ou ar condicionado!
Na coletiva de imprensa de 17 de junho, Sandro Magister observou que, enquanto o Instrumentum laboris contém questões críticas sobre os Pentecostais ou a urbanização, ele fala positivamente dos povos indígenas, sem abordar os males do canibalismo, do infanticídio e de outras práticas pagãs que ainda estão presentes em algumas tribos.
Ou feitiçaria. O documento preparatório e o Instrumentum laboris, assim como as declarações das pessoas envolvidas com o Sínodo, estão repletos de linguagem negativa com relação à industrialização, ou o que o Papa Francisco chama de “extrativismo”, i.e., a extração de material da terra; eles estão cheios de linguagem negativa sobre a economia de livre mercado e a propriedade privada. Mas eles não têm nada de negativo para dizer sobre as tribos amazônicas, algumas das quais praticam o canibalismo, infanticídio e a feitiçaria. As tribos indígenas são apresentadas de forma idílica, mas as tribos reais são muito diferentes.
Há algo mais que o senhor gostaria de acrescentar?
Para alguém como eu, que tem estudado a Teologia da Libertação e a teologia indigenista por várias décadas, muitas coisas nesses documentos são perfeitamente claras. Mas, para quem não acompanha essas correntes pode ser confuso ou pelo menos não totalmente compreensível.
Porém, as portas do Inferno não prevalecerão. Devemos encarar essa situação com serenidade e esperança, sabendo que Deus às vezes permite que o seu rebanho seja testado na Fé para que prove ser digno. E principalmente, não devemos nunca perder ou diminuir nossa veneração pela Sé de Pedro.
NOTAS.
[1]. Cf. [].
[2]. Cf. [].
[3]. Cf. [].